Elementos de Liturgia ( altar – defumação – amaci – banhos – música)
Elementos de Liturgia ( altar –
defumação – amaci – banhos – música)
Por influência do catolicismo, a Umbanda adotou o
altar, ponto forte em seus templos, terreiros, choupanas, casas, etc.
As imagens de santos, sincretizados com os Orixás, se
fazem presentes no altar, remetendo os fiéis a algo conhecido, acolhedor por
conta de o Brasil ser um país de maioria católica.
O altar da Tenda Nossa Senhora da Piedade, onde foi
fundada a Umbanda, contém imagens Católicas,
no topo há a imagem de Nossa Senhora da Piedade, que é a imagem da Pietá de
Michelangelo, onde Maria segura Jesus nos braços; teria dito o Caboclo das Sete Encruzilhadas
que:
“Assim como Maria segura Jesus, a Umbanda seguraria
os filhos seus”
A Umbanda não
inventou o sincretismo.
Sincretismo é
a junção de dois ou mais elementos de culturas que passa a ser um terceiro que
é “re-significado”, resultante desses dois ou mais elementos.
A Umbanda não
inventou o sincretismo de Santos Católicos com Orixás, no qual, São Jorge
representa Ogum, São Sebastião representa Oxóssi, Jesus Cris to
representa Oxalá, Nossa Senhora da Conceição representa Oxum, Nossa Senhora dos
Navegantes representa Iemanjá, São Bartolomeu representa Oxumaré, São Lázaro
representa Obaluaiyê, São Roque representa Omulu, Cosme e Damião representam Ibeji,
isso é sincretismo.
A Umbanda não
inventou esse sincretismo, ele já existia no Candomblé em algumas de suas rodas
muito antes de existir a Umbanda.
A Umbanda adotou o sincretismo como algo presente na
maioria das Tendas.
Na Tenda Espírita Mirim só há uma única imagem, a
imagem de Jesus Cris to considerado o
médium supremo. Depois surgirão algumas Tendas que vão abolir as imagens e vão
usar somente as pedras ou símbolos ou signos ou ponto riscado.
No entanto, a maioria das Tendas tem um altar com
santos Católicos, geralmente esse altar é construído numa mesa ou ele é
construído em degraus lembrando uma
pirâmide.
Quando o altar
é construído em forma de pirâmide, é comum que no topo fique a imagem de Cris to e nos outros degraus fiquem as imagens dos
outros santos Católicos representando os Orixás. É comum o altar de Umbanda ter
a forma piramidal que é uma forma hierárquica de representação.
Imagens de Caboclos e Pretos Velhos ficam num plano
um pouco mais abaixo no altar.
Na igreja Católica, no altar, existe um elemento
chamado “pedra Dara”. Essa pedra Dara é um recipiente no qual, geralmente, há
uma relíquia dentro. Uma relíquia é um pedaço do corpo de um santo.
Num altar Católico antigo e tradicional, colocava-se
no altar um pedaço de osso do corpo de um santo.
Em Roma, na Igreja de São Pedro, a força do altar é o
túmulo de São Pedro.
Isso é uma coisa que não se fala e que não se tem
ideia, mas é como se a relíquia, a pedra Dara e às vezes o próprio túmulo do
santo fosse o assentamento, o axé daquele templo, ali se coloca a relíquia, a
pedra Dara e as imagens estão em volta, muitas ou poucas imagens dependo da
igreja.
Relíquias podem ser de alguém que foi muito ligado ao
Santo(a) e não necessariamente do próprio.
Se existe um altar, há alguma coisa naquele altar que
justifique ele estar ali, geralmente não são apenas as imagens, existe algum
elemento antigo ou forte considerado algo que tem energia e presença.
A partir de Moisés, poderia se dizer até, das
conversas de Moisés com Jetro, seu sogro, Deus vai aparecendo a Moisés e vai
colocando como é que o sacerdote tem que se vestir, como é que é o sacerdócio,
como se monta um altar. Moisés encontra Deus, Ele dá as pedras da lei a Moisés,
Moisés quebra a pedra, a pedra é refeita. Então, Deus explica a Moisés como é
que ele vai construir a “arca da aliança”.
A arca da
aliança é o assentamento de Moisés, a arca da aliança que Deus descreve,
orienta, era considerado um ponto de força, de axé, tão forte que ninguém podia
chegar perto, senão a pessoa iria ser queimada, fulminada porque aquela força
era uma força terrível.
A arca da aliança seria colocada, mais tarde, no Templo de Jerusalém, originalmente o Templo
de Salomão.
A arca ficaria
num ambiente fechado, recluso.
Imagine o espaço
físico do Templo fechado, com salas dentro de salas e na sala mais reservada,
contígua, ficaria o santo do santo, onde apenas o sumo sacerdote poderia
entrar, ali é o axé, o altar sustentador da força, de toda energia.
O altar
Católico representa o ponto do Templo onde está o santo do santo.
No Terreiro, ou numa roça de Candomblé, não há altar,
as pessoas não ficam de frente para um altar porque um Terreiro de Candomblé é
um espaço que representa o universo com a dança circular, é um movimento circular.
As pessoas se movimentam num Terreiro de Candomblé de
forma circular diferente do Terreiro de Umbanda, ou de uma igreja em que as
pessoas estão alinhadas de frente para o altar.
No Candomblé o movimento é circular e o axé está no
centro do Terreiro, ou seja, no meio há o assentamento que pode estar construído
em cima do chão ou pode estar embaixo do chão.
Quando você entra num Terreiro de Umbanda ou de
Candomblé, se no centro do Terreiro existe uma construção, ali está o
assentamento. Às vezes não existe uma construção, às vezes há apenas uma lajota
de cor diferente e ali é colocada uma lajota de cor diferente ou um sinal no
centro do Terreiro para que se saiba que embaixo dele está o assentamento da
casa.
Os filhos,
quando entram nesse Terreiro, onde há uma lajota diferente no meio, eles cruzam
o chão e batem cabeça em cima daquela lajota.
Há Terreiros de Umbanda que colocam uma lajota
diferente no meio, onde está o assentamento e também colocam no altar, então,
as pessoas batem cabeça no centro, depois batem cabeça no altar. O que tem no
nosso altar? Tem um Otá, um assentamento - pode ser um Otá, pode ser alguns Otás,
alguns assentamentos e geralmente,
construídos em forma hierárquica e piramidal, os degraus onde Oxalá está no
topo e os outros santos abaixo.
Isso não é um segredo.
As pessoas costumam acreditar que quando tornam as
coisas um segredo, elas tem mais força, mas não tem mais força por ser um
segredo, tem força por ter fundamento.
Pai Ronaldo Linares, da Federação Umbandista do Grande
ABC, costuma orientar que no seu altar Oxalá deve estar no alto, o seu Orixá de
Frente na direita, o seu Orixá de Juntó na esquerda e os outros abaixo. Não tem
regra. O comum é colocar Oxalá no ponto mais alto porque ele representa a “fé”.
A imagem de Jesus sincretizada com Oxalá, representa
a “fé”. E a “fé” é a base de toda a religião, é o ponto alto.
Abaixo pode colocar o de Frente na direita, o de
Juntó na esquerda ou coloque abaixo aqueles que tocarem o seu coração da forma
que você acha que deve ser.
Por que nós temos um altar na Umbanda?
Por que a Umbanda copiou a igreja Católica?
Qual é o sentido, o fundamento de ter um altar?
Para que ter um altar?
Poderíamos ter apenas o assentamento como ponto
irradiante, vórtice de energia, ligação com a natureza.
A ligação com a natureza está no assentamento,
bastaria ter um assentamento. Para que ter um altar?
Quando nós rezamos a Deus, elevamos o pensamento ao
alto e as mãos para captar a irradiação de Deus e dos Orixás que vem do alto.
O tempo todo as irradiações estão vindo do alto para
baixo, recebemos as irradiações do alto que vem na vertical.
Na horizontal, existem as vibrações naturais chamadas
de correntes eletromagnéticas que nós estamos trocando e sentindo o tempo todo.
Mas, a irradiação pura de Deus e do Orixá vem na vertical. O que o altar faz?
O altar recebe
essa irradiação na vertical e por meio das chamas das velas, do assentamento,
da firmeza, de tudo o que houver no altar, coloca essa vibração que vem do alto
de frente para a gente.
A partir do momento que temos um altar, nós nos
colocamos de frente para o mistério ao qual estamos rezando: Deus, suas
divindades, os Orixás, os santos, os Caboclos, a força deles, o poder deles
está de frente pra gente por meio do altar, o altar se torna em si um vórtice
de energia, ele se torna um grande portal. Inclusive, algumas entidades, alguns
seres da natureza se manifestam a partir do altar, saem pelo portal que é
criado ali no altar de comunicação com dimensões e realidades paralelas, então,
esse é o fundamento de ter um altar.
O altar é o ponto irradiante de um Templo, o altar
irradia as virtudes, as energias positivas e a tronqueira é o ponto absorvente.
Temos um ponto irradiante, um ponto absorvente. O
altar irradiando as virtudes e a tronqueira absorvendo os vícios. O altar
irradiando energia positiva e a tronqueira absorvendo as nossas energias
negativas.
Assim se forma uma polaridade: altar e tronqueira é
esse duplo pólo, um irradia e o outro absorve.
Isso cria um campo de energia dentro do Terreiro, dá
movimento à energia dentro do Terreiro e isso está totalmente fundamentado, ou
seja, tem um por que.
O altar é algo que conforta e acalma os corações
daqueles que já são Cris tãos, maioria
do povo brasileiro, mesmo porque, deparar-se com um altar, uma imagem de Cris to, já
acalma o coração porque é um elemento conhecido.
A Umbanda não
é uma religião de exclusividade, é de inclusividade, ou seja, nós aceitamos
tudo aquilo que é bom, tudo que é bom é aceito, faz parte da nossa liturgia.
O que mais podemos falar de liturgia? Sobre
defumação.
Faz parte da nossa liturgia a defumação.
Não é exclusividade da Umbanda, nos rituais
Católicos, se procede à defumação.
O turíbulo, recipiente onde são acondicionadas as
ervas para a defumação, é usado em quase
todas as tradições.
Turíbulo é uma ferramenta, um instrumento de liturgia
para queimar essências e, por meio da fumaça, a essência exala perfume no ar e
a crença é que essa essência da defumação, limpa e purifica o ambiente.
Na cultura oriental, o incenso é muito comum.
Costuma-se usar varetas de incenso. No turíbulo se põe carvão em brasa e as
ervas ou as resinas para queimar em cima do carvão.
Na igreja
Católica o que se usa mais é a resina do olíbano, que é incenso também, tem
propriedades aromáticas que mexem com o nosso mental, com o nosso cérebro e
desperta o sentido de tranquilidade, harmonia, segurança.
Alguns defumadores, em tablete ou até em pó, aqueles
que queimam sozinhos, têm, em sua composição, ervas misturadas com pólvora e
com serragem, por isso queimam com facilidade.
O ideal é usar
erva seca pura ou com resina de boa qualidade.
O turíbulo pode ser de barro, ferro, não importa. O
que importa é que dentro desse turíbulo haja carvão em brasa, prepara-se o
carvão antes ou usa-se um recipiente com álcool onde se acende o carvão até
virar brasa, há de se aprender a lidar com o turíbulo para não se machucar, e
não se queimar.
Muita gente se
queima e não sabe acender um turíbulo, um defumador, uma maneira simples é: se
o turíbulo é de metal, algo simples é você colocar uma cumbiquinha de barro no
fundo dele, colocar um pouco de álcool nessa cumbuca, acender com cuidado e
deixar o carvão queimando sozinho ali em torno de uns quinze, vinte minutos até
virar brasa, se pega uma erva de boa qualidade, coloca-se dentro desse turíbulo
e logo começa a sair fumaça que é a
defumação, que tem a propriedade de limpar e descarregar o ambiente.
Aí você vai escolher as ervas: naquele dia o ambiente
está muito pesado? Você vai colocar ervas para cortar demanda. Naquele dia você
está precisando harmonizar? Você coloca ervas de harmonização. Naquele dia você
vai fazer uma Gira de Ogum? Coloque ervas de Ogum. Vai fazer uma Gira de Oxum?
Coloque ervas de Oxum.
Existe a possibilidade de escolha das ervas.
O incenso e o defumador mexem com as nossas emoções,
mas não é apenas para isso que eles existem, eles têm propriedades de limpar e
descarregar o ambiente, e costuma-se proceder da seguinte forma: colocam-se as ervas no turíbulo ou a resina, e
diante do altar, eleva-se o pensamento a Deus, Criador de tudo e de todos, Sua
Lei Maior e Sua Justiça Divina e pede-se licença a Oxóssi que é o Senhor de
todo reino vegetal, a Ossain, Senhor das folhas, para limpar e defumar o Terreiro,
que eles coloquem seu axé ali naquelas ervas ou naquela resina que está
queimando.
O procedimento de defumação começa quando o médium
responsável por essa tarefa, com o turíbulo na mão, passa pelos outros médiuns
da corrente balançando o turíbulo e parando na frente de um por um.
Geralmente os
médiuns colocam as mãos na fumaça e puxam-na para si ou giram em torno de si, no sentido anti-horário
para descarregar ou no sentido horário para receber a energia.
Se for um Terreiro pequeno, com poucos médiuns, dá para
parar de um por um e ir defumando, mas agora se você está num Terreiro grande,
com muitos médiuns, às vezes, não tem
muita saída de fumaça, então, o turíbulo tem que passar um pouquinho mais
rápido, tem que pensar em tudo isso.
A sequencia,
normalmente é: defumar o altar, a curimba, se houver o dirigente depois se
defuma o Terreiro em direção à porta da rua.
Tudo o que se faz para limpar, descarregar, se leva
para a porta da rua, a fumaça, o aroma, vão inebriando, enchendo o Terreiro até
a porta da rua, ao chegar à porta da rua,
se coloca o turíbulo na rua ou volte e guarde em local adequado.
Isto é a defumação, sua propriedade de queimar
energia negativa, purificar energia negativa e tornar o ambiente mais leve,
mais tranquilo para o trabalho espiritual aliviando assim parte da carga para
os Guias. Faz parte da liturgia de Umbanda.
Na Umbanda as ervas são muito importantes, inclusive
nos pontos cantados, se fala que são as ervas da Jurema, existem muitos pontos
de Umbanda e pontos tradicionais. São pontos cantados desde o início da
religião, há décadas e décadas, esses pontos são cantados em todos os
Terreiros.
A defumação é um dos momentos do ritual que tem a
maior variedade de pontos cantados. Canta-se para as ervas da Jurema, que são
importantes no culto e no ritual de Umbanda porque a nossa religião é uma
religião que reverencia a natureza.
Buscamos nas ervas a força da natureza que nos faz
falta porque vivemos a maioria de nós, em regiões metropolitanas, não temos
mais aquele contato com a natureza diário, não há, para a maioria de nós, esse
contato.
A Umbanda é uma religião urbana, metropolitana,
então, por meio das ervas a gente busca a força da natureza, a essência da
natureza. É comum se receitar banhos de
ervas e aí você vai também escolher as ervas de acordo com a sua necessidade.
O banho mais simples e mais usado é: guiné, arruda e
alecrim, é o grande banho genérico que serve para limpar, purificar,
energizar, equilibrar e etc.
O banho de
ervas pode ir à cabeça? Pode. É comum se proibir banhos de ervas na cabeça por uma influência
do Culto de Nação, do Candomblé. Porque no Candomblé só pode por na sua cabeça
a erva do seu Orixá, na Umbanda não. Você pode por todas as ervas na sua
cabeça, não tem problema nenhum.
A única restrição é:
Existem ervas
que são consideradas mais agressivas, como: “comigo-ninguém-pode”, “espada de
São Jorge”, que inclusive são ervas tóxicas, a própria arruda é abortiva, por
isso estamos falando de ervas para banho e não ervas para chá.
Há de se observar ainda, casos de reações alérgicas,
por isso todo cuidado e discernimento na hora de manusear ervas.
É preciso que se tenha o mínimo de conhecimento das
ervas dos Orixás, além de conhecer suas próprias reações quando utiliza ervas.
Há banhos de
ervas para todas as situações, para tudo que você imagina existe um banho
adequado e os nossos Guias, os Caboclos, os Pretos Velhos, eles recomendam muito
os banhos de ervas e, pelo menos no dia de trabalho, o ideal é que se tome um
banho de erva antes de ir para o Terreiro ou se não tem condição tome um banho
de erva de manhã.
Os banhos de ervas fazem parte da nossa tradição, além
deles existe o “amaci”. O amaci é um extrato forte de erva. Como é preparado um
amaci? Um amaci é feito geralmente pilando erva fresca. Então, se é um amaci de
Oxalá, você vai pegar as folhas de Oxalá ainda frescas e você vai pilar isso
com um pilão até você ter um sumo bem forte, um extrato bem forte daquela erva.
Usa-se uma quantidade pequena de água, diferente do
banho. E no amaci você não vai coar, vai fazer um preparado de erva. O amaci é
feito para ser aplicado na coroa do médium, é o banho de ervas que vai à coroa.
O amaci pode ser feito para limpeza da coroa e
geralmente o primeiro amaci que se faz é o amaci de Oxalá. Dentro do
sacerdócio, da preparação sacerdotal na estrutura de Pai Rubens Saraceni, são preparados quatorze
amacis para os quatorze Orixás.
O mais tradicional é o amaci com erva fresca, mas é
possível trabalhar o amaci com erva seca também, a diferença é que erva seca
sempre vai ter que dar uma pilada, usa-se o pilão para ativar, como se estivesse
acordando a essência da erva, então é possível trabalhar com erva seca também e
esse amaci é colocado na coroa.
Ritualisticamente, numa apresentação ou numa
iniciação, dentro do sacerdócio são feitos quatorze iniciações na força dos
quatorze Orixás. O que é uma Iniciação? Dentro da estrutura de Saraceni, a
Iniciação é a apresentação formal do médium ou do adepto – o médium de
incorporação – para o Orixá realizado no Templo ou na natureza.
No Templo é como uma Gira, então você vai fazer uma
Iniciação na força de Egunitá, você nunca viu Egunitá, nunca incorporou
Egunitá. O dirigente vai incorporar Egunitá, vai chamar a força de Egunitá para
esses médiuns incorporarem. Antes, cada um recebeu um amaci na sua coroa com o
axé de Egunitá para concentrar a força de Egunitá na sua coroa.
E assim é para Ogum,
Oxóssi, Xangô, Obaluaiyê. E existem amacis, para vários objetivos –
esse, acima citado, é o amaci usado na Iniciação dentro da estrutura de
Terreiro, um amaci para cada Orixá, um amaci para cada Iniciação – existem
amacis de limpeza, e de descarrego.
Na Tenda Nossa Senhora da Piedade existem poucos
rituais específicos além da Gira de atendimento e da Gira do desenvolvimento,
diga-se de passagem, na Tenda Nossa Senhora da Piedade o desenvolvimento mediúnico
é feito apenas com o trabalho prático dentro do Terreiro e uma vez por ano, é
feito um amaci.
É importante citar a Tenda porque é a primeira Tenda
de Umbanda que trouxe a tradição de fazer amaci, lá é feito o amaci na mata, do
lado de uma cachoeira. Os médiuns vão até a mata e cada um pega as folhas que
lhe agrada, mesmo sem conhecer, cada um vai lá e pega as folhas que mais lhe
agrada. Essas folhas são colocadas numa grande bacia, junto dessas folhas são colocadas
bebidas das entidades. Existe um amaci da Nossa Senhora da Piedade que é
colocado na bacia: a cerveja branca do Caboclo, a cerveja preta de Xangô, vai o
vinho, vai a cidra, misturam bebidas com ervas e ali misturado com a mão é
feito um amaci de ervas e bebidas.
Médium por médium, em fila, se ajoelha, deita no
chão, esse amaci é pego e é colocado na coroa do médium e ele naquele momento, vai incorporar a sua entidade com esse amaci
na coroa. É um amaci anual, de firmeza e de forças, que também pode ser feito
no Terreiro. Em alguns Terreiros, em algumas apresentações, Iniciações, se usa no lugar do amaci, colocar a bebida na
coroa do médium.
No Culto de Nação, o adepto não é aceito como tal,
não está de acordo se não fizer obrigação. Na Umbanda não, o médium faz
desenvolvimento mediúnico. Mas o Pai Ronaldo Linares, instituiu como obrigações
algumas oferendas aos Orixás e ele diz que não é algo que chama “obrigação”
porque é você que tem que se obrigar a fazer essas oferendas, mesmo porque
obrigação não é fundamento de Umbanda.
É uma questão de linguagem e na Umbanda essa questão
de linguagem é sempre um problema. Pai Ronaldo Linares faz as apresentações aos
Orixás no formato de oferenda e cada oferenda é uma obrigação. Quando faz
oferenda para Xangô é como uma Iniciação a Xangô, você faz uma pequena oferenda
com as velas para Xangô, com a bebida para Xangô e há o momento em que a
cerveja preta de Xangô é colocada na coroa do médium, que tem a cabeça coberta
e se recolhe para rezar para Xangô.
Da mesma forma se faz oferenda para os outros Orixás,
a bebida do Orixá é colocada na cabeça. É importante citar isso porque às
vezes, se ouve dizer que se você tomar um banho de erva errado na sua cabeça
vai ficar louco. Isso não vai acontecer. Ninguém vai ficar louco porque tomou
um banho de erva na cabeça. Pode ter sim uma alergia, talvez, ou ter os cabelos
ressecados, além de outras coisas de ordem prática.
Em alguns livros, está escrito que: se você colocar uma bebida alcoólica na sua
cabeça, banhando-a, vai ficar louco, não vai ficar louco, fará menos mal que
ingerir o alcoólico, com certeza.
Existem trabalhos de limpeza e descarrego na força de
Exu que se toma banho de pinga para descarregar, existem trabalhos na força de
Exu que você passa pinga na cabeça para descarregar, não se faz isso todo dia,
mas se faz num determinado momento.
Dizem que não se pode tomar banho de sal grosso de
cabeça, seria o mesmo que dizer que a gente não pode mais entrar no mar porque
o mar é água salgada. Então, se eu não posso por sal grosso na minha cabeça, eu
não posso mais tomar banho de mar, isso é uma grande bobagem. O que é preciso é
conhecer a erva e saber por que estou usando essa erva, se eu sei por que eu
posso lavar minha cabeça e eu passo a erva no meu corpo todo.
Como exemplo, podemos dizer o seguinte:
A pessoa vai até a farmácia, compra um xampu, um condicionador
que contém uma química violenta, lava a cabeça com a tal química e não faz mal.
Como é que um banho de erva vai fazer mal? Um simples banho de erva vai fazer
mal? Você compra uma tinta para pintar o seu cabelo que é uma química
violentíssima. E é um banho de erva que vai te fazer mal? Não.
O importante é saber para quê eu estou colocando na
minha coroa a erva, seja em forma de amaci ou banho. Mas, faça isso de uma
forma simples e simplificada sem complicar porque Umbanda é simples. No
entanto, tem fundamento é preciso conhecer.
A música é um fundamento da religião de Umbanda.
A Umbanda é musicada por tradição, dentro das
religiões, de quase todas as religiões há uma tradição musical.
Na Cabala Hebraica ainda se diz que: quando você quer
chamar um Anjo, você quer evocar, para ele saber que está sendo chamado, você
deve falar: “Rafael, Miguel ou Gabriel”, estou apenas falando o nome do Anjo.
Agora, se eu cantar o seu nome, então ele vai entender que está sendo chamado.
Daí vem também o coro de cantos Gregorianos dentro do Catolicismo onde o
objetivo do canto é ser ouvido pelas divindades e a música traz harmonia para
nossa vida, traz alegria para nossa vida.
Existe uma origem para o canto e para a dança que é
sagrada. Quem estuda a arte da dança vai encontrar a raiz dos movimentos da
dança nos templos antigos, quem estuda música vai encontrar a origem, a raiz da
música nos templos. Então, a religião também tem o objetivo de trazer alegria
para nossa vida ou pelo menos deveria ter o objetivo de trazer alegria para
nossa vida. A Umbanda é extremamente cantada, musicada, isso mostra uma descontração
dentro da religião.
A Umbanda é uma
religião des-repressora, a Umbanda tem o objetivo de dizer a você: “Viva sua
vida com alegria”. Em alguns momentos, a Umbanda praticamente nos ensina a
viver a vida com tanta liberdade como se não houvesse religião. Por quê? Porque
a Umbanda não nos enche de regras do que pode ou não se fazer, isso é muito
importante.
Isso não quer dizer que a gente pode sair cometendo
as maiores barbaridades, não é isso. O que quer dizer é que a Umbanda ensina
que “A semeadura é livre e a colheita é obrigatória”. A Umbanda não fica nos
enchendo de regras e proibições, a Umbanda nos ensina a ter consciência do que
é e do que não é bom.
A Umbanda ensina a se ter refinamento, qualidade de vida.
Existem algumas restrições que fazem parte do dia-a-dia do Terreiro que são
justamente restrições para que a gente consiga sentir melhor as energias que circulam
pelo nosso corpo.
Para os médiuns de incorporação, existe, por regra,
normalmente, que vinte e quatro horas antes da Gira não se deve comer carne,
beber e não deve ter relação sexual. Isto é pedido para que antes da Gira você
tenha esse preceito, essa restrição. Por quê? - Isso também faz parte da nossa
liturgia – Por que a Umbanda é contra o sexo? Contra a bebida? A Umbanda é
contra a carne? Não. Porque quando a gente tem uma relação sexual, a gente
troca energia e essa energia que você deu, dependendo do trabalho,
principalmente se é um trabalho de atendimento, pode lhe fazer falta.
Por exemplo,
você vai fazer um trabalho de cura, de atendimento, você precisa estar com a
sua energia em alta e às vezes a energia do outro que está em você pode ser uma
energia que não virá a ajudar durante um trabalho de cura, por exemplo, que é
um trabalho super sutil. Então, a questão do sexo é essa: é que aquela troca de
energia, às vezes, pode não colaborar com o trabalho.
O ideal é não proibir, é você sentir o que te faz bem
e o que não faz bem. Você é um laboratório, faça experiência, sinta no seu
corpo, mas faça a experiência de sentir a vida de uma maneira diferente.
Proíbe-se de comer carne porque a digestão da carne é pesada, ela leva até 48
horas para ser digerida.
E você está querendo incorporar um Caboclo, o Caboclo
quer trabalhar, mas o seu corpo quer fazer a digestão, a energia do seu corpo
está voltada a fazer a digestão, fica pesado, difícil de trabalhar incorporado
com aquele monte de carne. Agora, não adianta a semana inteira comer feijoada e
24 horas antes do trabalho no Terreiro você não comer carne, você está pesado
do mesmo jeito.
Você não come carne, mas faz uma refeição super
pesada e aí chega ao Terreiro para incorporar? Gira de Umbanda, geralmente é
sexta-feira à noite, antes de ir para a Gira, para o trabalho de Umbanda,
sessão de Umbanda, você janta? “Ah, mas, não comi carne”, você comeu tudo que
tinha, mas não comeu carne.
A questão é você estar atento à energia do seu corpo,
não beber é uma coisa óbvia, pois a energia da bebida, quando passa de certo
limite, embriaga: “Ah, mas o Guia incorporado bebe”, mas, ele está manipulando
a bebida, é diferente.
O objetivo na Umbanda não é proibir, é ensinar. No
momento em que você aprende o que é bom e o que não é bom para você, você não
precisa ser proibido de nada, a Umbanda não está aqui para proibir, ela não
proíbe, ela ensina.
O objetivo é lidar com a consciência, a Umbanda lhe
dá toda liberdade do mundo, você deve ter consciência que o preço da liberdade
é a responsabilidade e entre liberdade e responsabilidade, o único caminho é o
caminho da consciência.
Dentro de tudo isso, a Umbanda é uma religião de
alegria, de prazer, é uma religião de descontração, de dês-repressão e aí entra
a música na Umbanda com o seu atabaque que é uma escolha.
Há livros de
Umbanda que dizem que o atabaque estimula o animismo. O atabaque atrapalha
porque ele mexe com as suas ondas cerebrais. O atabaque é um instrumento
Xamânico, o couro, a percussão é um instrumento Xamânico.
A Umbanda é uma religião de transe. A Umbanda é uma
religião de êxtase religioso. A Umbanda é uma religião Xamânica também. E o
couro, o atabaque é um instrumento que entra como recurso de ajuda no transe.
Os Xamãs chamam o seu tambor de arco porque ele é o
arco e o Xamã é a flecha, esse arco vai lançar o Xamã num estado de transe. Então,
o atabaque bem tocado, é uma vibração que nos pega de baixo para cima, ele mexe
com o nosso sentido da terra, é algo que sobe, é algo que mexe com seu chacra
de base e a incorporação é um fenômeno visceral.
Quando o Ogã estuda e quando ele tira música, não
quando ele está surrando, batendo no couro, mas, quando ele tira música do
couro do atabaque, esse atabaque bem tocado com ritmo, com melodia, com
harmonia, ajuda, por quê? Porque Ogum tem uma vibração, Oxum
tem outra vibração, Iansã tem outra vibração, o toque do atabaque vai induzir
essa vibração, ele vai auxiliar a incorporação.
O toque de Oxum é melodioso, chama-se “o toque de
Ijexá”. E a música, os cantos de Oxum são cantos cadenciados e melodiosos como:
“Oxum lava meus olhos, Oxum minha emoção. Oxum flor das águas lava o meu
coração” Ou “Eu vi mamãe Oxum nas cachoeiras, sentada na beira de um rio.
Colhendo lírios, lírios ê, colhendo lírios, lírios á, colhendo lírios pra
enfeitar o seu congá”.
É esse o ritmo de Oxum, essa energia de Oxum, é a
cadencia de Oxum, diferente de Iansã que tem um toque de barra vento, um toque
de guerra.
Ogum também,
às vezes, traz um toque de guerra, o atabaque, a música ajuda a estabelecer
essa vibração, essa energia dentro do Terreiro, ele bem tocado é um recurso de
liturgia e ajuda o médium a descontrair porque o médium está ouvindo música,
ele gosta daquela música, ele está se soltando, ele está descontraído e a
incorporação se torna algo muito mais natural naquele momento.
A música é uma ferramenta e deve ser uma ferramenta
bem aproveitada, é uma ferramenta que vai trazer alegria, que vai trazer
profundidade, isso vai dar profundidade ritualística.
A música ajuda
a criar o ambiente e, no momento em que
está todo mundo tocando para Ogum ou para Oxum ou ainda para Iemanjá: “Mãe d‘água
rainha das ondas, sereia do mar. Mãe d’água seu canto é bonito quando tem luar.
Iê Iemanjá rainha das ondas, sereia do mar; rainha das ondas, sereia do mar”. O
embalo da música, do ritmo, induz o transe e tranquiliza a todos.
Alguns pontos são muito antigos e tradicionais,
conhecidos, isso traz para a pessoa, a memória das vezes em que ela foi à festa
de Iemanjá, então cria o ambiente, o vinculo. Da mesma forma na Umbanda, muitas
vezes se usa também a maraca que é o chocalho - a maraca ou maracá – que tem
todo um simbolismo, os nossos índios brasileiros usam muito a maraca.
O atabaque entra mais como influência afro e a maraca
entra com uma influência indígena. A gente tem aqui no Brasil os “Ka riri Xocó” são os guardiões da Jurema. Então, no
Catimbó, na Jurema sagrada o que mais se utiliza como instrumento musical é a
maraca, no Candomblé o que mais se usa é o atabaque.
Na Umbanda se usa bastante o atabaque e tem alguma
influência da maraca porque a maraca é um instrumento individual, é comum um ou
outro Caboclo usar a maraca. O chocalho ou a maraca bem tocada também induz o
transe, ajuda o transe e entra como uma ferramenta de trabalho importante.
Principalmente no desenvolvimento mediúnico, um
atabaque bem tocado, uma maraca bem tocada, bem cadenciada, tocando direitinho,
ajuda muito e colabora bastante com o trabalho mediúnico.
A música faz parte da nossa liturgia, a música é algo
que faz parte da religião de Umbanda e não só a música, mas a alegria, a
descontração, a dês-repressão.
Anna Pon
(baseado no Curso de
Teologia de Umbanda Sagrada – Desenvolvido por Rubens Saraceni – Ministrado por
Alexandre Cumino)
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