Jurema - A Recriação Contemporânea de um Mito
Jurema A Recriação Contemporânea de um Mito
Por Marcelo Bolshaw Gomes
Dentre os estudos da antropologia brasileira, a Jurema ocupa um lugar singular.
O próprio termo
comporta denotações múltiplas, que são associadas em um simbolismo complexo.
Além do sentido
botânico, a palavra Jurema designa ainda pelo menos três outros significados:
1. Preparado líquido à base de elementos do vegetal, de uso medicinal ou místico, externo e
interno, como a bebida sagrada, “vinho da Jurema”;
2. cerimônia mágico-religiosa, liderada por pajés, xamãs, curandeiros, rezadeiras, pais de santo,
mestras ou mestres juremeiros que preparam e bebem este “vinho” e/ou dão a beber a iniciados ou a
clientes;
3. Jurema sendo igualmente uma entidade espiritual, uma “cabocla”, ou divindade evocada
tanto por indígenas, como remanescentes, herdeiros diretos em cerimônias do Catimbó, de cultos afro-brasileiros e mais recentemente na Umbanda.
Numa primeira fase da colonização, a resistência dos povos indígenas no Nordeste, não permitiu
que a Jurema, enquanto árvore sagrada, fosse conhecida, em seus usos e significados, não sendo assim
documentada pelos colonizadores e estrangeiros.
Numa segunda fase histórica a Jurema representa um
elemento ritual ligado à própria resistência armada dos povos indígenas ou à guerra empreendida contra
inimigos inclusive em suas alianças. Ainda nesta fase na qual a Jurema começa a ser documentada, seu
significado ainda não é entendido, mas seu uso já é motivo de repressão, prisão e morte de índios.
Na
medida em que avança o rolo compressor da colonização a Jurema assume um lugar central na
religiosidade popular, não só indígena regional – Toré / Catimbó. Diante do componente negro a Jurema
garante seu reconhecimento, como entidade (espírito, divindade, cabocla) autóctone, “dona da terra”.
Nas últimas décadas é no contexto da Umbanda, religião nascente e em pleno processo de
sistematização e de expansão nacional, que a Jurema é integrada na cosmologia sagrada, no panteão da
religião nacional. Constatamos as “Linhas da Jurema”, dentre as linhagens e filiações religiosas da
Umbanda.
Não é difícil entender porque a Jurema seria sagrada para os índios nordestinos antes da chegada
dos brancos. Segundo Andrade, “enraizamento linguístico do termo Yu’rema na língua tupi é um forte
indício de que o uso primordial, inclusive cerimonial do vinho da Jurema, além de ser herança da
cultura indígena, regional, certamente já existia antes da presença dos colonizadores”.
Além de seu caráter alucinógeno e do seu comprovado uso nas guerras e ritos de passagem, a
Jurema, enquanto planta, desempenha um papel central no ecossistema semiárido das caatingas
nordestinas.
Não é difícil entender porque a planta deveria ser considerada sagrada para as tribos do sertão,
antes da chegada dos colonizadores. Mas, o fato é que a sacralidade da jurema foi uma identidade
étnica historicamente construída, em segredo durante a colonização por tribos litorâneas que não
tinham a mesma tradição.
Andrade argumenta que, durante o início da colonização, o uso da Jurema foi
tolerado e aceito pelos portugueses católicos quando era canalizado para lógica de guerra contra
invasores franceses e holandeses, enquanto seu uso religioso era condenado como feitiçaria.
Há vários
registros históricos (século XVI e XVII) sobre a eficácia militar dos guerreiros-juremeiros. Esta dupla
permissão/condenação favoreceu uma expansão secreta e silenciosa da Jurema, levando o uso da
bebida a ser conhecida pelas tribos amazônicas do Maranhão.
Aqui fazemos um comentário:
Sendo assim “Jurema” é muito mais que “Cabocla Jurema”. É uma verdadeira Nação do astral
ligada ao Catimbó como religião dos “Mestres da Jurema” tendo origem no “Toré indígena” que resume
toda uma força vegetal.
Dentro da Umbanda, o nome da árvore também representa a essência de cura
com as ervas, bem como sua manipulação, e o nome da entidade “Cabocla Jurema” que dispensa
comentários.
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