O que significa "bater cabeça" na Umbanda
O que significa "bater cabeça" na Umbanda
"Bater cabeça", faz parte da liturgia de Umbanda e varia de casa (templo, tenda, terreiro) para casa. Há sempre um procedimento padrão para o ato litúrgico que exprime respeito, fé, devoção, por parte de quem o pratica, portanto, "bater cabeça" não significa estar perdido, por exemplo, ou literalmente um ato de violência contra si mesmo.
"Batemos cabeça" diante do altar; saudando Deus, os Orixás e Guias que conduzem o templo (terreiro, tenda). Em algumas casas também se "bate cabeça" para o dirigente espiritual (sacerdote ou sacerdotisa); noutras poucas se "bate cabeça" também para a tronqueira.
"Bater Cabeça" diante do Altar é um dos atos mais importantes dentro do ritual de Umbanda, significa a entrega do médium que vai trabalhar, servir de instrumento à Espiritualidade, nesse momento o médium está “dando” sua cabeça (mental), o que há de mais precioso, sua coroa em prol do trabalho espiritual que vai se realizar, por isso é um gesto de grande importância que ainda remete à fé, ao respeito, à humildade e à completa entrega do médium para servir ao sagrado.
Só batemos cabeça para quem confiamos, neste momento estamos nos doando por inteiro, simbolicamente, por meio de um gesto ritualístico, estamos diante do Sagrado para servir.
Mesmo que ninguém nunca nos explique o que significa este ato de bater cabeça, intuitivamente já subentendemos seu significado, o gesto é muito forte e estar prostrado mexe conosco profundamente.
Batemos cabeça porque confiamos, sabemos, em nosso íntimo, que estamos diante de um poder superior e a ele nos submetemos conscientemente, dispostos a sermos instrumentos do bem maior que se manifesta em nós e em nossos irmãos de corrente.
Feito isso, sinceramente, de coração, nos aproxima dos outros, gera empatia, tolerância, compreensão. Tudo isso num simples gesto que a todos nivela naquele momento, pois estamos enviando uma mensagem: eu respeito minha fé, a ela me entrego assim como fazem meus irmãos de jornada.
Há milênios rituais religiosos adotaram este gesto de saudação como símbolo de respeito, hierarquia, adoração e devoção para manter a estrutura sacerdotal e o ambiente fraterno.
O que confunde as pessoas, as vezes, são os detalhes; por exemplo: como deve ser o gestual, deitado ou ajoelhado, com as mãos para frente ou para trás, quantas vezes toco o chão com minha testa e até o que devo falar ou pensar neste momento.
Segue exemplo pelo texto de Maria de Fátima Gonçalves:
Há uma diversidade muito grande dentro da Umbanda, a gente encontra rituais muito variados, inclusive quanto ao bate cabeça. A primeira Casa que frequentei, fora do meu próprio trabalho, tinha como regra o médium bater cabeça sem o uso de toalha, deitado e tocando a testa no chão por alguns bons minutos, com as mãos ao lado da cabeça e as palmas voltadas pra baixo. Não usar toalha e colocar as palmas pra baixo era sinal de submissão e obediência. Usar toalha ou virar as mãos pra cima seria arrogância. Ali a regra era bater cabeça no Altar, na frente dos atabaques e para o Dirigente. E o Dirigente poderia exigir que o médium ficasse deitado na frente dele por mais de hora, dependendo do seu “humor” no momento.
Depois de bater cabeça, o médium tinha de pedir-lhe a bênção em yorubá, era uma saudação longa. Entrei ali com mais de vinte anos de trabalho, mas um trabalho simples, com poucos rituais, na verdade acendia 1 vela branca e pedia as bênçãos Divinas, e os médiuns se cumprimentavam inclinando a cabeça e com as mãos juntas na altura do coração (saudando o “Deus interno” do outro). Não conhecia o costume de se tomar a bênção, muito menos naquela língua. Não sabia fazer, expliquei que não sabia. O Dirigente se irritou profundamente. Como “exemplo”, ele chamou uma garotinha de 7 anos de idade, mandando que ela pedisse a bênção. A menina fez direitinho. Mas para me “punir”, o Sacerdote determinou que ela batesse cabeça pra ele, deixando-a esticada no chão até ao final da gira, por mais de hora, dizendo que ali ele mandava... Saí dali, achei absurdo. Nunca me esqueço do rostinho dela, inocente, deitada num chão frio de cimento bruto, só pela vaidade daquele homem. Se eu pudesse voltar no tempo, mudaria aquilo, a minha ignorância puniu uma criança inocente. Estou aqui desabafando, me perdoem, mas isso me dói até hoje.
Logo depois, estudando, estive numa Casa onde a toalha era essencial: o médium jamais deveria colocar o ori no chão, seria um “sacrilégio”, porque o coronário é o ponto mais sagrado do corpo e jamais deveria tocar o solo. Na minha “primeira vez”, fui bater cabeça sem a toalha e levei uma bronca exemplar... Sinceramente, acredito que o que vale é o coração, a intenção. Mas respeito às regras de cada casa e procuro aprender... Só não aceito o exagero do “quero porque quero”...
O texto acima ilustra bem a situação e a relação da diversidade ritualística de uma casa para a outra. O mais importante é o significado do ato de saudar, entregar-se e reverenciar tocando o solo com a testa, claro, sempre com o devido respeito ao que se pratica na casa.
Há quem toque a cabeça de frente, depois para a direita e para a esquerda, saudando o “Alto, Direita e Esquerda”. Pode-se tocar a cabeça três vezes apenas pela força mística e “cabalística” que envolve o numero três; multiplicador e potencializador de todos os atos ritualísticos.
Batemos cabeça em nosso Altar e no Altar dos terreiros em que somos visita, em sinal de reconhecimento da energia e vibração daquela casa, caso nossa intuição não nos permita a realização do gesto, melhor pedir licença, com todo o respeito e educação e simplesmente ir embora, evitando assim aborrecimentos futuros.
Bater cabeça ao dirigente significa reconhecer sua hierarquia, sua investidura espiritual, outorga de trabalhos e declarando nossa entrega a seu trabalho, reconhecendo a importância do mesmo.
Hoje, porém, não é uma pratica comum bater cabeça ao dirigente, mas deve-se respeitar os que o fazem espontaneamente, é claro.
Bater cabeça é também um pedido de benção.
Anna Pon
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